Algumas palavras

Ser educador é ser um poeta do amor.
Educar é acreditar na vida
e ter esperança no futuro.
Educar é semear com sabedoria
e colher com paciência.

Augusto Cury

clube da Leitura: Um incentivo a leitura na Educação de Jovens e Adultos

NA EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS
CLUBE DA LEITURA: UM INCENTIVO A LEITURA
Pollyana Fernandes de Macedo
.
O
leitura na Educação de Jovens e Adultos. Vários são os
estudos que tratam da importância da leitura na escola,
mas no que diz respeito à formação de neoleitores, recém
alfabetizados e educandos da EJA, percebe-se que são poucas ou
quase inexistentes as produções neste campo de pesquisa. Na
maioria das vezes, o que se verifica é que os materiais usados para
o leitor iniciante neste nivel de ensino resumem-se a textos
infantilizados. Esta inadequação parece-me gritante no trabalho com
a EJA,o que não condiz ...
suas trajetórias, carrega consigo muitos conhecimentos, experiências
de vida longa e produtiva, ou seja, vivências que devem ser
valorizadas
Na maioria das escolas que fornecem esse tipo de ensino, o único livro
presente nas salas de aulas é o livro didático (o mesmo, muitas vezes
adotados para as crianças que frequentam o ensino fundamental). Quanto
ao uso dos textos literários, verifica-se que, conforme aponta Maria Dioniso
(2006), quando esse texto está presente na escola regular, sua presença
fica limitada à utilidade que se pretende dar a ele. Além disto, em quase
todos os livros didáticos o “texto” é reduzido a fragmentos para o ensino
da língua, da gramática e da ortografia. Ou seja, o texto é usado muitas
vezes como pretexto para aprendizagem de algo que não se refere ao seu
compreendimento. Assim, a leitura ocorre com um fim que se distancia da
fruição literária ou do diálogo com o conteúdo do texto em si mesmo,
dirigindo ao aprender-ensinar algo além e para o que ele não foi escrito.
Então, percebe-se que há um movimento em resposta ao
delegando uma função para a leitura. Vê-se na escola sempre uma ênfase
pragmática na leitura, uma visão utilitarista dela, mesmo quando se trata
do texto literário, deixando de lado a dimensão lúdica, do ler por ler, para
simplesmente se aventurar pelo texto. Segue-se daí que, muito facilmente,
a leitura passa a ser vista como algo cansativo, enfadonho, trabalhoso e
nada prazeroso.
Pode parecer necessário para alguns que as atividades destinadas ao
uso da leitura em sala de aula carreguem consigo essa dimensão prática.
Nós entretanto temos advogado contra ela, especialmente na EJA.
Entendemos que ler deve ser um direito e não um castigo.
De acordo com Soares (2004), é inevitável que ocorra a escolarização
da literatura, assim como ocorre com qualquer outro saber quando este
adentra a escola. Basta lembrar que a escola é a principal forma de acesso
ao livro em nossa sociedade para quem não freqüenta livrarias. Há
municípios onde a única biblioteca existente é a da escola.
Mas, se é necessário que essa escolarização da leitura, especialmente
a leitura literária, ocorra, que seja feita de uma forma mais adequada,
sem as “tradicionais” formas de controle usadas para comprovar se a
leitura foi feita, como provas, fichas de leitura, sofríveis trabalhos em
grupos, dentre outras formas de controle. Consideramos que essa forma
de escolarização da leitura é errônea e prejudicial à literatura, pois mais
afasta do que aproxima os sujeitos das práticas sociais de leitura
desenvolvendo , em muitos casos, uma aversão à leitura, que fica claro,
de acordo com o relato a seguir:
que o meu queixo trava e eu não consigo pronunciar as palavras
corretamente, ai fico nervosa e não consigo ler mais”
objetivo principal deste texto é tratar da importância da“com um público diferenciado que, por” (ARROYO, 2005).para quê ler,“Tenho muitas dificuldades em ler, parece. (Relato da aluna
13
P
ÁGINA
Jornal Bolando Aula Abril de 2009
Cristina
leitura em voz alta e conta que tem sido assim desde a escola primária
quando muito tímida, foi chamada a ler na frente da turma e gaguejou
errando muitas vezes o texto).
O texto literário deve ser algo que nos desloque do nosso lugar comum,
que mexa com sentimentos e emoções. Assim, como afirma Ligia
Cardermatori (2006), “
tanto para o que está dentro de nós, como para o mundo ao nosso redor.
Despertar a imaginação para aprender a ver de outra maneira a vida que
temos hoje e a diferente que um dia podemos ter
pressuposto pode-se entender Freire (1984), em seu livro
do ato de ler
se esgota na decodificação pura da palavra escrita ou da linguagem escrita,
mas que se antecipa e se alonga na inteligência do mundo. A leitura do
mundo antecede a leitura da palavra: “
conhecimento, como ato criador e como ato político é um esforço da leitura
do mundo e da palavra”
pragmáticos dos textos geralmente oferecidos como leitura aos alunos,
pois esses escondem muito mais do que revelam para a realidade. Partindo
de uma compreensão ampla da leitura de que o direito a ter acesso à
literatura deva ser universal, de fato, ou seja, defendendo que o direito a
literatura não é apenas de alguns poucos, mas também deve ser do aluno
da EJA, o que iniciou as atividades no Clube da Leitura.
O Clube da Leitura é um projeto que acontece atualmente com cerca
de 15 a 20 pessoas, que se reúnem no Centro Pedagógico - no Projeto de
Ensino Fundamental de Jovens e Adultos - 2
encontros são realizados duas vezes por semana,
trinta minutos antes do inicio das aulas, com duas turmas diferentes, a fim
de que eles possam se reunir para ler e trocar idéias acerca de textos de
diferentes autores clássicos e/ou contemporâneos da literatura brasileira.
Desta forma, é importante esclarecer que os alunos participantes não são
obrigados a ir aos encontros, todos são convidados e somente participam
aqueles que querem, sem nenhuma forma de controle de presença ou
desempenho.
A maior preocupação é fazer com que a leitura, realizada em pequenos
grupos, aconteça de modo prazeroso, lúdico, sem o uso de estratégias de
controle comuns ao ensino de literatura. Levamos um texto e, quando
possível, os próprios livros. Apresentamos suas partes e funções, autor,
editora, capa, contracapa etc. Realizamos a leitura em conjunto em voz
alta, e trocamos impressões acerca do texto, se gostam ou não e por quê.
A seleção de obras tem buscado uma linguagem e tamanho adequados a
estes publico. Algumas vezes optamos pelos livros da coleção distribuída
pela SECAD/MEC “
Machado, Clarice Lispector, Bartolomeu Campos de Queiroz e Sylvia Orthof,
entre outros. O importante é que o texto tenha tamanho, tema e linguagem
que facilite o alcance do leitor da EJA.
Assim, através da leitura de textos literários pretendemos fazer com
que a prática da leitura supere as marcas de exclusão, promovendo a
entrada desses leitores nesse universo cultural, como direito democrático.
Portanto, damos espaço e lugar para ampliar o universo cultural dos alunos,
para que falem de suas trajetórias de leitor e, quem sabe, superem algumas
dificuldades construídas durante suas vidas na escola.
Nos encontros realizados, um lê em voz alta, pode ser o mediador, e os
demais acompanham com o texto (a leitura é livre). As reuniões não duram
mais que meia hora. Os alunos trocam idéias a partir dos textos, falando
de suas experiências e angústias a respeito da vida. Trocam informações
sobre o passado e o presente. Suas falas caracterizam muito bem essas
trocas. A aluna Maria
auxiliaram muito em seu desempenho na sala de aula:
conseguia ler em público, hoje já consigo sem dificuldades
um aspecto que verificamos ser muito comum para eles: pensam que a
1 que reclama sempre, dizendo ter muitas dificuldades em fazer aAbrir um livro é como abrir os olhos e o coração. ”Partindo desteA importância, quando afirma que a compreensão crítica do ato de ler nãoa alfabetização como ato de. A leitura não pode ficar limitada aos usoso. segmento, o Proef -2. Osfora da sala de aula,Literatura para todos”. Também lemos contos de2 deu seu depoimento ressaltando que os encontros“Antes eu não.” Sua fala reforça
aula de leitura serve para aprender a ler em voz alta
o apoio que eles têm dado aos colegas, principalmente aqueles que têm
maiores dificuldades em ler e aqueles que ainda não participam, falando
de que como é agradável reunir-se para ler e
como isso tem sido útil para eles. Manifestamse
muitas vezes dizendo gostar dos livros
apresentados. Trata-se de doações da Editora
Mazza, de Belo Horizonte, como:
. Nota-se claramenteLeite do peito
e
a gente lembrar das coisas da roça”; “Ele faz a gente lembrar da nossa
infância”.
Ouvindo estrelas. “Este livro é muito bom, faz
Entender e fazer compreender que o direito à literatura é um direito
de todos é papel dos educadores que se sentem comprometidos com
uma prática educativa libertadora, emancipatória, como diria Paulo
Freire. Sendo assim, pensamos que a atividade de leitura deve-se
tornar uma atividade democrática, a fim de não assumir formas de
exclusão. Segundo Jane Paiva (2003), através do texto literário, a
cultura do silêncio - desenvolvida por jovens e adultos que pensam
nada saber, porque não sabem ler e escrever ou não o fazem
bem -
pode começar a dar lugar a uma outra cultura: a da historia, a da
memória, que resgata múltiplos saberes e refaz, com sucesso, os
sentidos da vida de quem se pensa sem valor. Portanto, trabalhar
para que essas formas de exclusão sejam quebradas é poder
proporcionar a esses jovens e adultos o acesso a um direito ate então
não reconhecido.
Notas:
1
Nome fictício.
2
Referências bibliográficas
ARROYO,
em Educação de Jovens e Adultos.
M. Apresentação. In: SOARES, Leôncio et al. DiálogosBelo Horizonte: Autêntica, 2005.
CADERMARTORI,
educadores / Lígia Cadermartori, Ira Maciel, Jane Paiva. – Brasília:
Ministério da Educação, 2006.
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COSTA
Mazza, 2003.
, J. (org.). Ouvindo estrelas: antologia. Belo Horizonte:
DIONÍSIO,
sujeito letrado. In: Educação em Revista. Belo Horizonte: UFMG.
Faculdade de Educação, v.1 (1985). v. 44. Dez. 2006.
M. Facetas da literacia: processo de construção do
FREIRE,
completam. São Paulo: Cortez, 1984. 96 p.
P. A importância do ato de ler: em três artigos que se
GUIMARAÊS,
Miranda. Belo Horizonte: Mazza, 2001.
G. Leite do peito: contos. Ilustrações: Regina
PAIVA,
possíveis no Currículo? In: PAIVA, C; Martins, A; Paulino, G, Versiani,
Z. (orgs).
O jogo do livro. Belo Horizonte: Autêntica / Ceale. UFMG, 2003.
J. Literatura e Neoleitores Jovens e Adultos – EncontrosLiteratura e letramento: espaços, suportes e interfaces
SOARES,
Aracy.
M. Escolarização da Leitura Literária. In: EVANGELISTA,O jogo do livro, Belo Horizonte: Autêntica / Ceale. UFMG, 2001.
Pollyana Fernandes de Macedo
Pedagogia – Bolsista PROBIC-FAPEMIG, orientada pela Profª Doutora
Carmem Lucia Eiterer, do DMTE – Departamento de Métodos e Técnicas
de Ensino. Pesquisadora
é graduanda do curso de
Idem.